A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), permitindo que juízes julguem processos nos quais uma das partes seja cliente de escritórios de advocacia de seus familiares, levanta um questionamento inevitável: como garantir a imparcialidade e a credibilidade do sistema judiciário diante de possíveis conflitos de interesse?
Por 7 votos a 4, a Corte declarou inconstitucional a regra do Código de Processo Civil que proibia essa prática, sob o argumento de que juízes não podem ser responsáveis por monitorar a carteira de clientes de seus cônjuges ou parentes até o terceiro grau. Gilmar Mendes, principal defensor da mudança, alegou que a restrição era inviável, enquanto Cristiano Zanin defendeu que a regra limitava o exercício profissional de advogados que possuem parentes na magistratura.
O problema central dessa decisão não está apenas na dificuldade de fiscalização, mas no que ela representa em termos de percepção pública sobre a Justiça. Como confiar plenamente em um julgamento quando existe uma conexão financeira – ainda que indireta – entre o juiz e um dos advogados da causa? Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Barroso foram contra justamente por entenderem que a regra antiga evitava riscos de favorecimento e fortalecia a transparência.
O Judiciário brasileiro já sofre com uma imagem desgastada, sendo alvo frequente de críticas sobre corporativismo e privilégios. Essa decisão, em vez de reforçar a credibilidade da Justiça, pode intensificar a desconfiança da sociedade. Em um país onde a separação entre poder e influência ainda é uma luta constante, a dúvida sobre a imparcialidade de um julgamento pode ser tão prejudicial quanto a certeza de um erro.
Ao abrir essa brecha, o STF coloca em xeque a lisura dos processos e deixa uma questão no ar: até que ponto os interesses privados podem se misturar com a função pública sem comprometer a essência da Justiça?